Quem lança um olhar superficial e pouco atento sobre as jurisprudências e sentenças judiciais que tratam de contendas em condomínios por vezes pode julgar contraditórios alguns resultados. Mas o fato é que as regras que orientam a convivência nesses espaços de moradia em coletividade são flexíveis e cada caso deve ser sempre avaliado à luz de seu contexto.
Em maio deste ano, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que condomínios não podem proibir moradores de terem animais domésticos de estimação, como cães e gatos, em apartamentos. No entanto, em agosto, por meio de uma determinação do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), uma senhora moradora de Florianópolis precisará se desfazer de dois de seus cães, sob o risco de pagamento de multas diárias no valor de R$ 300,00, caso não cumpra a ordem judicial.
Como pode, então, termos duas decisões que se confrontam? O segredo está no que há por trás de cada história, ou seja, as entrelinhas. Antes de formular uma opinião, é importante conhecer um pouco mais dos fatos para compreender contextos.
Em primeiro lugar, ao contrário do que muitos erroneamente interpretam e divulgam, devemos ressaltar que a decisão do STJ não libera geral a presença de animais em apartamentos. Há sim, situações em que eles podem ser vetados. As convenções condominiais podem fazer restrição quando os bichos apresentarem risco à segurança, higiene ou à saúde dos demais moradores e nisso está incluído também o direito ao sossego.
Foi justamente nesse ponto que se baseou a decisão do TJSC para limitar o número de cães da moradora da capital catarinense: a mesma vive acompanhada por quatro cães da raça Spitz Alemão ou Lulu da Pomerânia em seu apartamento de 50 metros quadrados. Os vizinhos se queixam dos constantes latidos que se distribuem por todos os turnos, inclusive o noturno.
O caso foi parar na Justiça por iniciativa da própria mulher, que acionou o 2º Juizado Especial Cível em busca de indenização por danos morais de um morador e do próprio condomínio, sob alegação de sofrer perseguição e assédio de ambos para se livrar dos seus animais. Ela garantiu que seus bichos “não geram incômodos a quem quer que seja”. Inobstante, teve seu nome inscrito no livro de reclamações condominiais por diversas vezes e ainda precisou pagar multa em três oportunidades.
O condomínio contestou as acusações e esclareceu que não se opõe à presença de animais nas unidades, mas considera excessivo manter quatro cachorros em apartamento diminuto e de raça reconhecidamente barulhenta. O juiz considerou as contestações relevantes e concedeu prazo de 60 dias para a dona escolher apenas dois cães para permanecer em seu apartamento.