A Lei n.º 14.405, de 12 de julho de 2022, altera o artigo 1.351 do Código Civil, para tornar exigível, em condomínios edilícios, a aprovação de 2/3 (dois terços) dos votos dos condôminos para a mudança da destinação do edifício ou da unidade imobiliária antes condicionada à 100% dos condôminos
Aqui vamos avaliar esta alteração, como até e porque não, um retrocesso a serviço da insegurança jurídica. Em relação ao texto original do artigo 1.351, muito já se falou, cabendo neste ensaio avaliar supostos benefícios vs. malefícios, afinal, como diz o dito popular, “o diabo está nos detalhes”.
Digo isso pois defendo sempre que as soluções ao condomínio edilício devem sempre serem pensadas “de dentro para fora”, jamais o contrário.
Tenho certeza de que em uma rápida leitura do novo artigo 1.351 do Código Civil, haveria razões para comemorar, afinal, quando pensamos em alterar áreas comuns, mudando sua destinação/funcionalidade original (como por exemplo, capacitar uma área verde em uma quadra poliesportiva), não seria mais necessário atingir o quórum de 100% dos condôminos
Mas como “a vida não é feita só de flores”, a mesma “abertura”, ainda que para fazer o bem, autoriza, em seguida sua utilização para disfarçar o mal!
Se o legislador queria “facilitar” a vida dos condomínios, bastaria lembrar da recente alteração do artigo 1.353 do Código Civil (falamos dela na edição 302 de março 2022), por onde é possível superar o quórum qualificado por meio de sessão permanente ao longo de debates no intervalo máximo de 90 dias, não reduzir o quórum!
Avalie comigo, caro leitor: Agora, a mudança de destinação residencial para mista, tanto para abrigar profissionais autônomos, como para permitir contratos de hospedagem (considerando que o Superior Tribunal de Justiça, a exemplo dos Tribunais inferiores, claramente prestigiam a destinação residencial ao vetar a exploração comercial das unidades), poderá ser alcançada com apenas (frise-se) 2/3 (dois terços), inclusive por meio de sessão permanente!
Aquele condômino que escolheu um condomínio residencial, convicto que para preservar tal destinação seria necessário apenas sua reprovação em assembleia, agora, corre o risco de ter que fazer sua mudança, caso “investidores” pretendam, por exemplo, permitir contratos de hospedagem via aplicativo, profissionais liberais passem a receber seus clientes e empregados na unidade autônoma…
Dizer – como foi dito pelo relator da proposta legislativa em análise – que a Lei em análise permitirá que os condomínios se adaptem às posturas municipais é, na prática, pensar (impor) soluções de “fora para dentro”, tornando os condôminos reféns de uma insegurança jurídica (típica de nossa República) para atender interesses externos.
E assim, para cada passo à frente, somos obrigados a voltar dois… Resta saber como o Judiciário irá se comportar quando testada a constitucionalidade da Lei.
Advogado condominial, integrante da Comissão de Direito Condominial da Ordem dos Advogados de Barueri/SP