Por Kênio de Souza Pereira
A convivência mais próxima entre as pessoas em decorrência do compartilhamento de espaços nos edifícios aumenta a possiblidade de conflitos. Isso é natural diante da enorme diversidade cultural, de valores e padrões entre as pessoas. O problema é que algumas pessoas, por se sentirem contrariadas, ao invés de buscar uma solução racional, optam por denunciar o vizinho ou o condomínio perante os mais diversos órgãos, buscando incomodar ou até se vingar de algo que o aborreceu. Ocorre que, muitas vezes, essa denúncia além de prejudicar o denunciado se volta contra o denunciante, já que o agente público, ao comparecer no condomínio poderá fiscalizar outros pontos resultando numa notificação que exigirá a regularização ou multa, o que o atingirá também.
Dessa forma, vemos muitos denunciantes se arrependendo por agir de forma impensada ao acionar órgãos da Prefeitura, o Corpo de Bombeiros, Defesa Civil, o Ministério Público, a CEMIG, a Copasa, dentre outros, que nunca iriam ao condomínio para fiscalizar, mas que acabaram sendo forçados a comparecer ao serem provocados a tomar alguma providência.
Obras – Um dos maiores problemas que os condomínios enfrentam é a realidade de que muitos construtores e proprietários de apartamentos de cobertura e térreos realizar obras após a concessão da Certidão de Baixa de Construção, antigamente denominada Habite-se. Certamente, se a nova obra prejudica o vizinho, acarreta risco de segurança ou dano à harmonia visual da fachada, se justifica a denúncia inclusive no início da obra, pois ninguém pode agir numa propriedade coletiva como se residisse numa casa, pois nesta a propriedade é única, não é compartilhada como outros coproprietários.
Entretanto, há inúmeros casos em que a obra realizada na cobertura ou no térreo não incomoda a ninguém. Mas o vizinho, às vezes movido por inveja ou por desejar prejudicar alguém em especial, promove a denúncia, forçando o fiscal a constatar outras irregularidades em todo o prédio, como as varandas que foram fechadas, aumento de área construída para vagas extras de garagem, pilotis, recuo do prédio, construção de churrasqueira, academia, espaço gourmet, etc.
Ao receber uma notificação para regularizar o prédio, isso implica, em alguns casos, no pagamento de verdadeiras fortunas pela construção que superou Coeficiente de Aproveitamento, tendo como consequência a ordem de demolir caso não seja possível a regularização. Haverá ainda a alternativa de contratar um advogado especializado em Direito Imobiliário para contestar a multa ou as exigências, pois em alguns casos o Poder Público extrapola, podendo ser mais barato investir num processo judicial do que arcar com valores astronômicos.
AVCB – O mesmo ocorre com as denúncias, muitas vezes anônimas, para o Corpo de Bombeiros Militar. Uma vez concedido o AVCB (Auto de Vistoria do CBM) a uma edificação, após alguma nova construção, reforma ou ampliação, é raro o imóvel ser novamente fiscalizado espontaneamente. A concessão do AVCB significa que a edificação está de acordo com o projeto técnico aprovado e certifica a segurança da edificação.
Há centenas de edifícios plenamente regulares, pois obtiveram a Baixa de Construção, que sempre foi precedida, há décadas, de prévia anuência do Corpo de Bombeiros. Portanto, esses edifícios antigos estavam regulares, mas diante das novas normas do Corpo de Bombeiros, vemos condomínios tendo problemas com a fiscalização, que de forma exagerada, exige obras e novos investimentos que acarretam despesas expressivas, que às vezes prejudica até a utilização de espaços na garagem.
Isso poderá resultar na contratação de advogado para se defender das exigências descabidas, que afrontam a lógica jurídica ou a contratação de engenheiro para fazer o novo AVCB e as obras de alto custo, as quais poderiam ser evitadas.
IPTU – Poucos são os profissionais que entendem as regras e os cálculos que compõem as guias do IPTU, sendo comum os proprietários reclamarem sem constatar que o valor do imposto está dentro da realidade. A Prefeitura de BH afirma que de cada 100 reclamações, metade é deferida e, da outra parte, a maioria se reflete em redução de IPTU, mas em aproximadamente 20% dos casos o IPTU pode até aumentar. Isso porque, quando for atender ao pedido, a PBH irá pesquisar não só o item reclamado, mas todas as características do imóvel. Se, além do que o contribuinte reclamou existir algo errado que não constava no cadastro, o cadastrista tem obrigação de atualizar esse acerto, o que pode fazer o imposto ficar maior que o originalmente lançado.
O risco para os condomínios consiste no fato de que há proprietário de apartamento, sala ou loja que compõe um condomínio, que comete o erro de reclamar por mero capricho, provocando a ida do auditor fiscal no edifício.
Quando for atender ao pedido, o auditor da PBH irá pesquisar não só o item reclamado, mas todas as características do imóvel, sendo fator determinante para a apuração da avaliação do valor venal o padrão de acabamento que leva em conta a fachada e as características externas do edifício. Se esse foi modernizado, tendo trocado o revestimento externo de tijolinho por mármore/granito, substituído as grades externas por vidros laminados, dentre outros itens de luxo, o valor de cada apartamento será majorado com a elevação do padrão de acabamento.
Dessa forma, o proprietário de um apartamento que reclama do IPTU poderá afetar todos os demais apartamentos, conforme §7º, do art. 17, do Decreto nº 15.828 de 29-12-2014.
Pense bem – É preciso entender que uma denúncia por irregularidade de edificação é irreversível e pode gerar muitas complicações para os demais proprietários, que não têm qualquer relação com a briga entre dois vizinhos.
Portanto, para não se arrepender, pense bem antes de denunciar, procure um especialista, pois o amadorismo custa caro. Dialogar, buscar uma composição e deixar de se importar com a vida alheia é mais inteligente, pois pode evitar desgastes e angústias.
Há Há*Vice-Presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal – Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB/MG (2010 a 2021) – Diretor Regional em MG da ABAMI – kenio@keniopereiraadvogados.com.br