Assembleia virtual apenas se a convenção autorizar

Assembleia virtual apenas se a convenção autorizar

Por Kênio de Souza Pereira

Realizar reunião afrontando a convenção gera risco de nulidade e prejuízos nas decisões dos condôminos

 

As assembleias virtuais não se equiparam, ainda, às presenciais, por não apresentarem meios seguros que garantam a redação da ata no decorrer da reunião, a troca de argumentos quando há um grande volume de participantes sendo que o assunto é complexo e um controle da votação que seja eficaz. Certamente é benéfico o uso da tecnologia nos condomínios para aumentar a participação dos coproprietários, especialmente quando são exigidos quóruns mais elevados para aprovar as deliberações. Entretanto, a realização da assembleia por meio virtual exige sua previsão na convenção, sob pena de haver o comprometimento das deliberações.

 

O Projeto de Lei nº 548/2019, que tramita no Congresso Nacional, visa acrescentar ao Código Civil o seguinte dispositivo: art. 1.353-A “permitir à assembleia de condomínios edilícios votação por meio eletrônico ou por outra forma de coleta individualizada do voto dos condôminos ausentes à reunião presencial, quando a lei exigir quórum especial para a deliberação da matéria”. A novidade se limita a colher os votos por meio eletrônico após a assembleia, caso a votação presencial não tenha obtido o quórum qualificado, o que na prática implica numa votação híbrida, o que não se confunde com uma reunião virtual.

 

Convenção – O referido Projeto de Lei tem seus méritos, mas independentemente de sua aprovação, para que a votação eletrônica seja aplicada nos condomínios, ela deverá ser autorizada na convenção da mesma forma que o edital enviado por e-mail ou WhatsApp. Portanto, se o condomínio deseja implantar esses novos procedimentos deve contratar um especialista para fazer a atualização da convenção, que poderá aproveitar para contemplar vários avanços jurisprudenciais que podem inibir a inadimplência, evitar dúvidas quanto aos quóruns e facilitar a aplicação de multa contra condutas antissociais.

 

A presença média nas assembleias é de cerca de 17% nos condomínios residenciais e de menos de 10% nos comerciais, o que gera dificuldade de aprovação quando é exigido quórum qualificado. Os principais motivos de ausência dos condôminos são a falta de tempo, a desorganização, falta de objetividade nas reuniões, as discussões acaloradas e os desgastes decorrentes de manifestações sem a devida educação, que dificulta a troca de ideias.

 

Se a assembleia contasse com uma assessoria jurídica especializada para explicar a convenção e as dúvidas, haveria um clima mais proveitoso que resultaria no aumento de comparecimento dos condôminos diante das orientações técnicas que exigem estudo prévio dos temas. Neste caso, é imprescindível que o advogado especializado seja contratado com antecedência suficiente para que estude todos os documentos, a convenção e o que será debatido conforme o edital, tornando a assembleia mais produtiva. Isso exige tempo e investimento nesse trabalho, pois é um equívoco pensar que o advogado irá dar soluções de casos complexos em alguns minutos na reunião, pois ele poderá ser induzido a erro por não ter analisado a documentação previamente.

 

Legislação – Diante da situação provisória e emergencial provocada pela Pandemia do Covid-19, o Presidente da República sancionou, a Lei nº 14.010, em junho de 2020, que “Dispõe sobre o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET) no período da pandemia do coronavírus (Covid-19)”. A citada lei abrange os condomínios edilícios, mas de maneira temporária, sendo que o artigo 12 estabelece que a assembleia condominial e sua votação, em caráter emergencial, poderiam ocorrer por meios virtuais até 30/10/20. Não há lei que autorize a assembleia virtual a partir de 1º/11/20, prevalecendo a convenção, devendo o síndico e todos os condôminos respeitá-la, em especial quanto a forma de realização da assembleia, sob pena de nulidade das deliberações aprovadas indevidamente.

 

Não tem o síndico que ceder ao pedido de um ou outro condômino que deseje impor a assembleia por meio virtual, mesmo que seja justificável a solicitação, pois o síndico, nos termos do artigo 1.348 do Código Civil tem o dever de cumprir as leis e a convenção, sendo irregular a elaboração de edital para assembleia virtual quando a convenção não prevê essa modalidade.

 

Deve ser considerado o padrão dos moradores e as particularidades do condomínio, pois muitas pessoas não têm acesso à internet, e outras, por serem idosas, têm dificuldade de acessar os meios virtuais, podendo reclamar por se sentirem excluídas. Entretanto, nada impede que os condôminos venham a alterar a convenção para incluir a assembleia virtual, ou híbrida, mediante a aprovação de 2/3 dos condôminos, evitando dúvidas e riscos de nulidade das deliberações.

 

* Diretor da Caixa Imobiliária Netimóveis – Conselheiro do Secovi-MG e da Câmara do Mercado Imobiliário de MG – kenio@keniopereiraadvogados.com.br